quinta-feira, 17 de março de 2016

OS PAIS DA IGREJA




A expressão "Pais da Igreja" foi aplicada aos santos homens de Deus que sobressaíram em meio às dificuldades e perseguições impostas ao cristianismo. Foram homens de caracteres bem talhados e claramente delineados, que não tiveram o menor receio em se expor diante do perigo, mas decididamente defenderam a fé cristã, tanto no falar como no escrever e no agir.

Não fizeram caso algum de suas vidas, pois acharam que morrer por amor a Cristo era quase nada, considerando o que Ele enfrentou e fez por nós. Foram homens abnegados que se envolveram integralmente em favor da Igreja, alguns deles conviveram com parte dos discípulos e apóstolos originais de Jesus Cristo.

O período dos "Pais da Igreja" ou "Era Patrística" iniciou no final do primeiro século (após o período apostólico) e se estendeu até o quarto século da era cristã.

A história desses homens ficou registrada, o tempo que permaneceram palmilhando nesse mundo, foi mais do que suficiente pata torná-los, não apenas heróis da fé cristã, mas inesquecíveis para a história do povo de Deus.

Ao findar o primeiro século da era cristã, o momento era decisivo na história do cristianismo, pois uma a uma das testemunhas que conviveram pessoalmente com Cristo, que presenciaram seus milagres, que receberam os seus ensinamentos foram desaparecendo.

Entre os apóstolos vemos que Paulo e Pedro, os mais respeitados, foram martirizados na cidade de Roma entre os anos 66-67 d.C., o apóstolo João foi a última testemunha, resultando num personagem semilendário, devido o muito tempo que permaneceu na Ásia Menor, tornando-se a última das testemunhas das origens do cristianismo.

Na passagem do primeiro para o segundo século, surgiu um novo período permeado por grande obscuridade, a ausência de todos os apóstolos.

O cristianismo correu o risco de se constituir em mais uma seita judaica, entre as muitas outras existentes e que agitavam a Palestina, no entanto a pregação do Evangelho produziu efeitos imediatos com o surgimento de novos líderes cristãos.

Inácio (67?- 110 d.C.)

Foi discípulo do apóstolo João e bispo em Antioquia, razão de ser chamado de Inácio de Antioquia. Não é possível dizer com exatidão, mas por volta do ano 110, o prestigiado bispo de Antioquia, Inácio é sentenciado e condenado injustamente a morte, sob alegação de ter recusado a adorar os deuses do Império Romano.

Era praxe romana promover espetáculos usando vidas humanas que eram lançadas as feras na arena. Enquanto Inácio era levado como prisioneiro da cidade de Antioquia para Roma onde seria martirizado, ele escreveu sete cartas (cinco para as Igrejas da Ásia Menor, à Igreja Romana e a Policarpo - bispo de Esmirna), as quais se transformaram em verdadeiras riquezas ao cristianismo primitivo. Nestas cartas, entre as questões estabelecidas reiterou os princípios da fraternidade, ds hierarquia e da unidade do povo de Deus.

Trechos contidos nas cartas:

"Evitem as divisões como o princípio do mal. Sigam a seu bispo, como Jesus Cristo seguiu ao Pai; e aos presbíteros, aos apóstolos e aos diáconos rendam consideração, como mandamento de Deus."

"Eu quero que todos os homens saibam que eu morri por Deus e por minha própria vontade. Deixem-me ser entregue as bestas selvagens, porque através delas eu posso alcançar a Deus. Eu sou o trigo de Deus e eu sou moído pelos dentes das bestas selvagens, que elas tornem-se meu sepulcro e que não deixe nenhuma parte do meu corpo para trás, de modo que, eu não seja, quando adormecer, pesado para ninguém. Então serei verdadeiramente um discípulo de Jesus Cristo, quando o mundo nem ao menos vai ver o meu corpo."





Policarpo (69-155 d.C.)

Foi mais um dos discípulos do apóstolo João, bispo de Esmirna. Por volta do ano 155, um grupo de cristãos foi acusado, julgado e condenado pelos tribunais, porém, o interesse maior do imperador Antonino, o Pio, era prender o bispo Policarpo.

Ao ser preso foi levado à presença do governador juntamente com uma multidão pagã e concedido a ele a opção de negar o nome do Senhor Jesus. Tentaram persuadi-lo dizendo que olhasse para a sua idade avançada, ouve novas insistências para que se curvasse diante do imperador e maldissesse a Cristo, isso seria suficiente para a sua liberdade, mas Policarpo resolutamente reafirmou: "Faz 86 anos que eu o sirvo, e nenhum mal me fez como hei de maldizer o meu Rei, que me salvou?".

Ao final do julgamento, o juiz o ameaçou dizendo que seria jogado às feras, depois o ameaçou de ser queimado vivo. Diante da sentença, Policarpo adiantou que o fogo que o juiz acendesse duraria alguns instantes e logo se apagaria, mas o fogo do castigo eterno seria permanente.

Quando viram a decisão irrevogável de Policarpo, o juiz determinou que ele fosse queimado vivo, sendo que a multidão foi apressadamente preparar a fogueira. Amarrado e já dentro da fogueira, em meio às chamas orou agradecendo a Deus por tê-lo considerado digno de morrer como mártir em prol da causa cristã.



Justino (100-166 d.C.)

Também chamado de Justino o mártir, por causa de sua convicção inabalável da fé cristã e disposição incansável de combater publicamente qualquer tipo de ataque ao povo de Deus, isso fazia corajosamente e sem nenhum receio da censura por parte do Império.

Justino nasceu em Neápolis (antiga Siquém), provavelmente no mesmo período da morte do apóstolo João. Foi exatamente no momento da conversão de Justino (por volta de 130 d.C.) que o cristianismo se encontrava em meio a uma conturbação provocada pelos falsos profetas que pretendiam confundir o povo, o que trouxe inicialmente a Justino certa dificuldade para distinguir o trigo do joio.

Justino tinha uma escola de filosofia em Roma na qual ensinava que a verdadeira filosofia er o cristianismo. Viajou por muitos lugares como um ensinador itinerante, alcançou muitas almas para Cristo e tornou-se um dos filósofos que penetrou na classe alta e levou muitas pessoas cultas e filósofos contemporâneos ao batismo.

Foi desafiado pelo cínico Crescêncio (filósofo pagão) a um debate, no qual Justino com toda a intelectualidade que lhe era peculiar sobressaiu-se, não somente isto, mas o cristianismo foi o grande vencedor em todos os sentidos.

Crescêncio inconformado com a derrota vingou-se de Justino e mais seis de seus discípulos, acusando-os e consequentemente conseguiu levá-los aos tribunais. Sempre havia antes do martírio um julgamento na tentativa de convencer os acusados a retratarem-se, no caso, negar a fé cristã. Justino se levantou conscientemente diante do tribunal e atestou que após ter estudado todo tipo de doutrina existente, tinha concluído que a cristã era a única e verdadeira, "afirmou ter encontrado no cristianismo a única filosofia segura, que satisfez todos os seus desejos", e, portanto, não pretendia abandoná-la.

Ao serem ameaçados de morte demonstraram alegria em sofrer por amor a Cristo e que os matando lhes fariam um grande favor. Assim sendo, foram açoitados e depois decapitados.




Irineu( 130-200 d.C.)

Nasceu na Ásia Menor, provavelmente em Esmirna. Foi um discípulo fiel de Policarpo, a quem considerava seu grande mestre. É chamado de Irineu de Lião (hoje é a França) e chegou a ser presbítero desta Igreja, em substituição ao bispo Fotino que fora martirizado.

Era um autêntico pastor, nunca teve interesse pelas especulações filosóficas ou descobertas teológicas, mas preocupou-se em dirigir o povo na sã doutrina e refutar intensamente as heresias quem eram crescentes. Como pastor, teve o censo na medida, possuía a riqueza da doutrina.

Ele deve ter morrido na virada do segundo para o terceiro século. Jerônimo confere a ele o título de mártir.





Tertuliano (150-220 d.C.)

Também chamado de Tertuliano de Cartago, devido ao seu nascimento em Cartago- África. Deve ter se convertido ao cristianismo aos quarenta anos na cidade de Roma. Logo depois de sua conversão, retornou a sua cidade de origem, onde passou a escrever em defesa da fé cristã, principalmente contra os pagãos e hereges.

Era advogado romano o que lhe dava relativa segurança para censurar o Império Romano como intolerante e perseguidor. Ele declarou: "Vamos, bons governadores, mais estimados ainda pelas multidões quando lhes imolais os cristãos, atormentai-nos, torturai-nos, condenai-nos, esmagai-nos: vossa iniquidade é a prova de nossa inocência. Todos os vossos requintes de nada servem, antes redobram o atrativo de nosso povo, tornando-nos mais numerosos todos às vezes por vós ceifados: o sangue dos cristãos é uma semente."

Era uma atitude de bravura. Tertuliano se tornou o primeiro teólogo cristão que escreveu em língua latina, o que lhe rendeu grande influência na teologia ocidental.



Orígenes (185-254 d.C.)

Conhecido como Orígenes de Alexandria, veio a ser o mais destacado discípulo de Clemente de Alexandria. Nasceu em um lar cristão, recebeu ótima educação e ainda muito jovem chegou a impressionar seus pais pelas perguntas referentes às Escrituras.

Quando seu pai foi preso sob a perseguição do Sétimo Severo, Orígenes ainda bem jovem quis acompanhar o pai no cárcere, porém sua mãe o impediu escondendo as roupas. Nesta época tinha dezessete anos e sendo privado de sair de casa, escreveu uma carta ao pai encorajando-o a ser fiel até a morte.

O pai de Orígenes (Leônidas) foi martirizado. Logo após a sua morte a família teve os bens confiscados pelo governo, o que provocou muitas dificuldades na família. A mãe ficou com sete filhos, sendo Orígenes o mais velho. Diante das dificuldades econômicas, apareceu uma cristã rica de Alexandria, querendo socorrer a família, mas ela era envolvida com os gnósticos, o que fez Orígenes rejeitar todo tipo de ajuda, pois para ele a pureza de sua fé não abonaria tal procedimento.

Orígenes era uma pessoa de "gênio excepcional e chegou a ser famoso como mestre da fé cristã". Dedicou-se inteiramente ao ensino em uma escola cristã, causando grande repercussão no Império Romano, pois não somente os cristãos de diversos lugares vinham ouvi-lo, como também pagãos, entre os mais conceituados estava a mãe do imperador e governador da Arábia.

Não sabemos a razão exata, mas tudo indica que uma dose de ciúme causou atrito entre Orígenes e o bispo de Alexandria, forçando Orígenes a deixar Alexandria e ir para Cesaréia onde prosseguiu ensinando por mais 20 anos. Foi considerado o homem mais ilustre de sua época, escreveu inúmeras obras e produziu milhares de cópias. Aproximadamente dois terços do Novo Testamento foram mencionados em seus escritos.





Eusébio (260- 340 d.C.)

Nasceu na Palestina e chegou a ser bispo de Cesaréia no tempo do Imperador Constantino, sobre o qual exerceu influência. Acima de qualquer conceito direcionado a Eusébio, ele é lembrado como o “ Pai da História da Igreja ". Fez uma narrativa da trajetória do povo de Deus, começando nos dias de Cristo até o Concílio de Nicéia (325), momento em que Constantino tornou-se o Imperador do Oriente e do Ocidente.

Discorrer sobre história do povo de Deus sem incluir Eusébio " é comparado com tentar descrever a história da Igreja Apostólica sem o livro de Atos dos Apóstolos ". Entre as muitas obras de sua autoria, encontram-se obras apologéticas, bíblicas e dogmáticas, embora seu ponto forte não ser a teologia, mas a história.




Jerônimo (340-420 d.C.)

Sofrônio Eusébio Hierônimo nasceu próximo da fronteira da Itália com a Dalmácia (antiga Iugoslávia). Ainda bem novo foi enviado para estudar em Milão e depois em Roma, visando principalmente a gramática, a retórica e a filosofia, e ainda tornou-se um erudito no hebraico, no grego e latim. Naquele tempo era raro encontrar alguém com tamanha bagagem cultural, era um homem apaixonado pelo mundo da erudição.

Nas grandes obras de Jerônimo encontra-se a sua tradução da Bíblia em Latim (a conhecida Vulgata, tradução do hebraico para o latim). Ele foi o primeiro pai da Igreja latino a conhecer o hebraico. Sofreu uma forte oposição por ter mexido no texto tradicional.

No ano 386 foi para Belém da Judéia onde fundou um mosteiro e aí permaneceu até o fim de sua vida.




João Crisóstomo (345-407 d.C.)

Nasceu na grande cidade de Antioquia (terceira cidade do Império Romano). Pertencia a uma família culta, o seu pai era um homem de posição social elevada.

João foi educado pela mãe, pois aos vinte anos ficou viúva e dispensou um segundo casamento para dedicar-se inteiramente ao filho. Aos 18 anos foi batizado e logo em seguida tentou viver uma vida monástica. Viveu por alguns anos em uma caverna fora de Antioquia, tendo a saúde prejudicada, voltou a Antioquia e tornou-se diácono e depois presbítero.

Foi um pregador eloquente, estadista e dedicado pregador da Bíblia. João Crisóstomo recebeu o apelido de "boca dourada" ou "boca de ouro", pela sua oratória inigualável e o ritmo incansável, pregava no tempo e a contra tempo. Não era um teólogo de primeira grandeza, as mensagens pregadas eram frequentemente práticas e devocionais, porém conquistava o coração do povo.

Deixou Antioquia e foi para Constantinopla (397). De um lado transparecia causa de promoção, por outro lado, seria a sua infelicidade. Diante do paganismo existente em Constantinopla, ele acreditava que " qualquer homem inflamado de zelo consegue reformar um povo". O seu trabalho inicial foi denunciar os abusos praticados pelos clérigos e as injustiças sociais.

No afã de coibir os abusos pregava ousadamente, esperando com isso promover as mudanças desejadas, entretanto, surtiu efeito contrário, pois entrou em choque com a corte, tendo como consequência o seu encaminhamento para o exílio, onde morreu.






Agostinho de Hipona (354- 430 d.C )

Aurélio Agostinho nasceu em Thagast (Argélia) sua mãe era católica cristã e seu pai era pagão (converteu-se ao cristianismo na véspera de sua morte). Embora pertencesse a uma família pobre, conseguiu estudar em Cartago - Roma, depois em Milão ( capital do Império Romano em 384).
Agostinho tornou-se um mestre grandemente apreciado por seus alunos. Mesmo galgando altas posições como mestre brilhante de retórica, vivia numa inquietação constante gerada pelas lutas interiores, pois até então era insatisfeito por não saber com exatidão qual era o seu chamado na vida.
Finalmente aos 32 aos, Agostinho experimentou a paz interior tão desejada, e com propriedade exclamou: "Tarde te amei, Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Eis que estavas dentro de mim, e eu lá fora, a te procurar! Eu, disforme, me atirava à beleza das formas que criaste. Estavas comigo, e eu não estava em ti. Retinham-me longe de ti aquilo que nem existiria se não existisse em ti. Tu me chamaste, gritaste  por mim, e venceste minha surdez.  Brilhaste,  e teu esplendor afugentou  minha cegueira. Exalaste teu perfume, respirei-o, e suspiro por ti. Eu  te saboreei, e agora tenho fome e sede de ti. Tocaste-me, e o desejo de tua paz me inflama."

Foi por volta do ano 388 que Agostinho retornou a África. Procurou saber quais eram as cidades que não tinham bispos e evitou visitá-las com receio de ser forçado ao ofício, mas em 391, quando passava por Hipona (norte da África) ele foi reconhecido e condicionado ao sacerdócio, lá permaneceu até a sua morte. Viveu quarenta anos em Hipona, era uma das mais influentes cidades africanas.

Agostinho foi considerado por alguns como o maior teólogo da Igreja antiga, e considerado por outros como o maior teólogo desde o apóstolo Paulo. É chamado de pai da Igreja Ocidental. Seus pensamentos e doutrinas dominaram a Idade Média. Atuou de forma irrepreensível em sua vocação teológica, deixando um legado de aproximadamente 113 obras e 225 cartas.
Agostinho morreu no terceiro mês do ano de 430, quando um exército bárbaro invadiu a cidade de Hipona. Após a sua morte, o Ocidente começou a se "agostianizar". Através de seus escritos ele está sempre presente, é lido, imitado, conservando-se apreciável.


 Agostinho morreu no terceiro mês do ano de 430, quando um exército bárbaro invadiu a cidade de Hipona. Após a sua morte, o Ocidente começou a se "agostianizar". Através de seus escritos ele está sempre presente, é lido, imitado, conservando-se apreciável.



 

Referência: Noll, Mark A. Momentos Decisivos na História do Cristianismo; Editora Cultura Cristã
Hurlbut,Jess Lyman; História da Igja Cristã; São Paulo: Editora Vida, 1995.

Ramos, Moysés Pastor; O Povo de Deus e Sua História; IBADEP (Instituto Bíblico das Assembléias de Deus do Estado do Paraná)

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